terça-feira, 21 de abril de 2009

O restaurante branco onde se serve passado

Ela veio cansada do trabalho. Teria que almoçar sozinha, o que lhe causava desânimo. Aliás, nos últimos tempos, tudo lhe causava desânimo. O trabalho já não era mais o que ela queria, as brigas constantes com o marido a entristeciam cada vez mais e uma leve tristeza já fazia parte do olhar.
Ao virar a esquina, viu a placa de um restaurante. Estranho, nunca o havia visto naquele lugar. A casinha branca e simples chamava a atenção. Decidiu parar para almoçar. Adentrou o pequeno portão que separava a rua do jardim. Orquídeas roxas eram banhadas pelo sol, uma brisa suave tomava conta de tudo.
A construção antiga era aconchegante. Mesas e cadeiras delicadas mobiliavam o local. Fotos antigas nas paredes davam um ar nostálgico a tudo aquilo. Pela janela dos fundos pode ver jabuticabeiras.
Um garçom veio atendê-la. Pediu strogonof de frango e um refrigerante. Enquanto esperava, pensava na vida. Nas contas do fim do mês que já estavam vencendo, na falta de dinheiro, no relacionamento com o marido e no trabalho.
Estava perdida nesses pensamentos quando colocaram o prato em cima da mesa. Mas aquele não era seu pedido. Levantou os olhos para reclamar e, surpresa, deu de cara com a avó, que sorridente a olhava.
Como podia ser? A avó havia morrido há anos. Mas ela não teve medo, muito pelo contrário. Sentiu-se feliz. Olhou para o prato e viu que aquela era a sopa que só a avó sabia fazer. Era a sopa de sua infância. O prato especial para meninas especiais, como a velhinha costumava dizer.
A senhora sentou-se na cadeira em frente à neta e conversaram por horas. Lembraram das travessuras de criança e de como a avó acobertava e protegia a menina. Riram juntas, cantaram como antigamente e acariciaram-se.
Como sempre fazia, a avó levantou-se da mesa, pegou o prato já vazio, deu um beijo na neta e caminhou até a cozinha. A mulher não pode mais seguir a velhinha com os olhos, já que alguém a chamava pelo nome.
Ela olhou para o lado e viu um homem com uma flor na mão. Aquelas feições eram de alguém que ela conhecia, mas não se lembrava de quem eram. Ele, sorrindo, continuou a ofertar o presente.
Ela estendeu a mão e quando segurou a flor lembrou-se. Guilherme. Aquele era Guilherme, o namoradinho da infância. Na mesma hora, uma valsa começou a tocar. Era a música que eles haviam dançado no aniversário de quinze anos dela. Eles tinham se preparado por meses e mesmo assim ele errara os passos na hora da festa. Ela riu e os dois começaram a dançar.
A música acabou e Guilherme a beijou no rosto. Ele a fitou profundamente e disse: “Lembre-se de quando era criança”. Ela balançou a cabeça afirmativamente e ele se foi pela porta dos fundos.
Ela ficou ali parada por alguns minutos tentando entender o que havia acontecido. Não havia o que entender. Sentiu um alívio no peito. Saiu.

Textos e imagens desse blog só podem ser publicados e/ou utilizados em outros locais com autorização da autora.

Um comentário:

Lian Tai disse...

Oi Mayara! Cheguei ao seu blog, atraída pelo título deste texto, na lista de blogs da Érika. Li o texto e adorei! Simples e lindo! Bjs!